sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Choque de desconfiança

Vai ser a eleição da desconfiança, sugerem as pesquisas. Os eleitores não escondem suas dúvidas sobre a honestidade, a sinceridade e a capacidade de liderança dos atuais candidatos à Presidência. Essa resiliência se reflete nas taxas de rejeição, persistentemente elevadas. O caso de Lula é exemplar. Aos 72 anos, é o político mais popular — nove entre dez eleitores o reconhecem, segundo o Datafolha, e, entre esses, 67% afirmam conhecê-lo “muito bem”. Natural para quem atravessou metade da vida em cima de um palanque.

O primeiro comício de Lula candidato aconteceu 35 anos atrás, na Curitiba de 1982. Eleito presidente, duas décadas depois, manteve três discursos diários, por rádio e TV, durante oito anos. Elegeu Dilma Rousseff falando por ela na campanha de 2010, às vezes imitando-a, como fez em Salgueiro (PE) para uma plateia de sertanejos. Escanteado por Dilma, em 2014, persevera como o eterno candidato preferencial do PT.


Lula lidera com 36% a preferência para 2018, informa a pesquisa da semana passada. É o dobro das intenções de voto do segundo colocado, Jair Bolsonaro, ex-capitão paraquedista que desceu na cena política em 1987, com um plano para explodir bombas na Vila Militar, da Academia das Agulhas Negras, em Resende (RJ), e em quartéis da cidade do Rio.

O resultado obtido por Lula é considerável, e compatível com o histórico de liderança mais reconhecida, cujas votações sempre foram acima do patamar alcançado pelo PT nas urnas, em torno de 20%. Pode ser visto como proeza, considerando-se a circunstância de ser um candidato já condenado a nove anos e seis meses de prisão, por corrupção e lavagem de dinheiro, que figura como réu em mais cinco processos, está acusado em outros três e é, ainda, investigado em mais um dos casos de propinas em negócios da Petrobras, do BNDES, das indústrias de construção civil, de automóveis e de aviões. Lula vagueia pelo país em campanha na tentativa de transformar seus problemas judiciais em causa eleitoral.
Mais significativa, porém, é a resiliência do eleitorado na rejeição ao ex-presidente. Há 12 meses seguidos, segundo o Datafolha, quatro em cada dez eleitores repetem que não votariam em Lula “de jeito nenhum”. Isso ocorre tanto nas capitais e cidades de regiões metropolitanas (40%) quanto nos municípios do interior (38%) com mais de 50 mil habitantes. Há uniformidade no repúdio por idade, por escolaridade (a partir do ensino médio), por renda (mais de dois salários mínimos) entre empregados, desempregados ou ocupados.

Alguns interpretam a persistência na rejeição a Lula como evidência de resistência a símbolos da corrupção na política desvendada nos inquéritos do mensalão e na Lava-Jato. Mais provável é a decepção de um eleitorado que não reconhece líderes com capacidade suficiente para resgatar o país de crises como a da saúde e reconduzi-lo à rota do desenvolvimento. O risco é de fragmentação superior à da eleição de 2014, quando um terço dos eleitores anulou, deixou em branco ou simplesmente se recusou a sair de casa para votar. Num cenário assim cabem os versos elegantes de Paulinho da Viola: “Desilusão, desilusão/ Danço eu dança você/ Na dança da solidão.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário